domingo, 3 de maio de 2015

Agora eu sei o que é ser enterrada viva', diz Marina Ruy Barbosa ao se transformar em uma noiva-cadáver para a série 'Amor te amo'

Arianne Botelho, Johnny Massaro e Marina Ruy Barbosa em cena de "Amorteamo" Foto: Leo Martins

RIO - O cenário é soturno, melancólico como num filme de Tim Burton. Uma noiva-cadáver, com vestido sujo e molhado, maquiagem dos olhos borrada, cabeleira negra bagunçada e boca pálida, surge em meio aos túmulos e a 15 esculturas de isopor de um cemitério. Nem parece, mas a moça é Marina Ruy Barbosa, que se enfia numa cova com a ajuda de produtores e tem terra — ou melhor, farofinha de biscoito — jogada nas mãos e no rosto pelo coveiro vivido por Tonico Pereira. Uma chuva artificial com direito a raios completa o quadro lúgubre.

— Agora eu sei o que é ser enterrada viva — diz Marina, já encharcada e cada vez mais encardida, cujos ouvidos foram protegidos por algodão.

Alguém da produção brinca com Marina: “Imagina que você está em uma praia na Bahia”, enquanto Tonico, Johnny Massaro e Arianne Botelho ensaiam seus diálogos, igualmente molhados.


A atriz Marina Ruy Barbosa em cena dentro de uma cova - Leo Martins
A cena, incomum na teledramaturgia nacional, é de “Amorteamo”, série de cinco episódios que estreia na sexta-feira, depois do “Globo repórter”, e será exibida semanalmente. Com aposta no sobrenatural, a história segue a linha do melodrama: tem suicídio, assassinatos, vingança. A todo momento, há uma mistura de amor e morte, como explica Cláudio Paiva, autor ao lado de Guel Arraes e Newton Moreno.

— Não tem nada morno. Tudo ferve. Toda hora tem uma morte, uma cena meio barra-pesada. É tudo muito passional. É o melodrama com aposta na estrutura do novelão clássico — analisa Paiva.

A ideia veio do pernambucano Moreno, que escreveu um projeto com adaptações de histórias de assombrações e lendas urbanas do Recife Antigo. Para que se adaptasse melhor ao formato televisivo desejado, Paiva e Arraes (também recifense) se juntaram e formaram o time principal de autores, mantendo os elementos principais da história.

— É uma grande história de amor. Não é solar, de fato, tem coisa de terror e suspense. Mas a preocupação era mesmo explorar o amor — ressalta Paiva.

A história ambientada em Recife, no início do século XX, explora dois triângulos amorosos: o primeiro entre Arlinda (Letícia Sabatella), Aragão (Jackson Antunes) e Chico (Daniel de Oliveira). O segundo entre Gabriel (Johnny Massaro.), a brejeira Lena (Arianne Botelho) e a funesta Malvina (Marina). Criado por Aragão, Gabriel é fruto da traição de Arlinda com Chico, morto pelo algoz no momento em que o filho era gerado. Atraído pela morbidez, o rapaz é apaixonado por Lena, sua irmã de leite, filha de Zefa (Ghueza Sena), empregada de Aragão. Mas, por tramoias familiares, é obrigado a se casar com Malvina, menina tão fúnebre quanto ele. Ela se comunica com a mãe — já morta — por meio de um retrato e é superprotegida pelo pai, Isaac (Isio Guelman).

— Com Lena, há um sentimento de complementação, ele é a escuridão, ela é a luz. Com a Malvina, Gabriel se reconhece nesta escuridão — compara Massaro.


Johnny Massaro e Arianne Coelho: amor dramático em cena - Leo Martins
Ao descobrir que não é irmão de Lena, Gabriel abandona Malvina no altar do dia do casamento. Ela se joga de uma ponte e morre afogada. Ele, arrependido, volta ao cemitério para buscar o corpo e a leva para casa. Malvina volta a viver e traz com ela todos os mortos da cidade.

— A dor é muito forte, e o amor também. É isso que move esses personagens. O amor que ela tem pela morte, ela tem pelo Gabriel. Malvina tem fascínio pela morte, acha bonito o sofrimento, se mutila, gosta de passear em cemitérios. E é por amor e para atingir o Gabriel que se mata. Como se ali começasse uma maldição na vida dele — observa Marina.

Ainda na pele da ninfeta Maria Ísis, de “Império”, quando “Amorteamo” começou a ser gravada, a atriz precisou ficar três semanas trabalhando nas duas produções ao mesmo tempo. Mas, ela diz, quando recebeu o convite para a série, nem pensou em recusar.

— Na hora eu fiquei pilhada. Afinal, apesar de a Maria Ísis ter sido uma mocinha cheia de nuances, essa é a minha chance de fazer algo diferente de tudo que venho fazendo. Não sei quando farei algo assim de novo. É muito intenso, me dá a chance de experimentar, buscar outros caminhos. Eu amo fazer novela, mas é legal estar em um produto que você sabe início, meio e fim — festeja a atriz que, por conta das coincidências de agenda, não pode cortar ou pintar o cabelo — ela usou peruca e lentes pretas para a composição — e se inspirou em filmes como “A noiva-cadáver”, “A lenda do cavaleiro sem cabeça”, “A órfã” e “Os fantasmas se divertem”.

Tanto Marina quanto Massaro e Arianne foram escolhidos pelos autores e pela diretora Flávia Lacerda. De São Paulo, a ainda desconhecida Arianne veio ao Rio especialmente para o teste. Ao terminá-lo, relembra, já sentiu algo especial no ar.

— Depois do teste, eu e Flavinha nos olhamos olho no olho, nos abraçamos e sentimos uma coisa muito boa — conta a atriz de 21 anos que, por causa do trabalho, já se mudou para o Rio e buscou suas inspirações em personagens de Sônia Braga, como Gabriela e Dona Flor. — No meio de toda essa escuridão da série, a Lena vem como uma luz na vida do Gabriel e da família dele. Ela tem uma personalidade feliz, para cima.

Foi a partir de Arianne que Flávia realizou testes com atores para escolher quem faria Gabriel já que, a princípio, Massaro não estaria disponível para participar do elenco, que ainda conta com nomes como Maria Luiza Mendonça, Guta Stresser, Bruno Garcia, Aramis Trindade e Gustavo Falcão, entre outros.

— Ariane foi espetacular, brilhante. E como demorei para escolher os garotos, ela me ajudou. Mas no fim, Johnny podia, fez um teste e mandou por telefone, e foi amor à primeira vista. Já Marina, a gente queria muito. Pela história, pelo percurso, vamos vê-la saindo do lugar-comum — conta Flávia.

Diretora de atrações como as séries “Sexo frágil” (2003) e “Queridos amigos” (2008) e novelas como “Belíssima” (2005) e “Insensato coração” (2011), Flávia afirma que fica um pouquinho angustiada com as cenas pouco comuns que dirige em “Amorteamo”, a maioria delas gravadas nos estúdios do PoloRio Cine & Video, em Jacarepaguá. Na cena do cemitério, por exemplo, a diretora perguntava o tempo se estava tudo bem com a atriz.

— Marina, será que você pode gravar mais uma vez? Mas só se você puder, não queremos forçar — pede ela, recebendo um retorno positivo da atriz.

Mas a diretora garante: a série não é sombria.

— É uma história forte sobre amor e morte, esse questionamento sobre para onde vai o amor quando se morre. Todo mundo vai perder ou deixar alguém, então nossa história trata de uma assunto universal, faz pensar e sentir. Como é um melodrama, tudo é extremamente falado e sentido — descreve ela, que cita como referências o circo, o cinema mudo, o expressionismo alemão, o filme “Moulin rouge” e, claro, as produções de Tim Burton: — Fomos beber na fonte do Chaplin. É uma recriação com pé no fantástico. Fora gente de carne e osso, nada ali é realista.

Do elenco de “Meu pedacinho de chão” (2014), Massaro comemora a chance de, mais uma vez, fazer um trabalho que fuja do realismo, como o anterior.

— Acho muito louca essa sorte maravilhosa que foi trabalhar numa novela que não tinha o menor compromisso com a realidade, muito pelo contrário, era lúdica e colorida, e depois cair aqui, nessa história totalmente melodramática. A gente chora mesmo, grita mesmo, sofre mesmo — pontua o ator.

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